As canções que ouvimos ao longo da vida ficam profundamente gravadas em nossas mentes, permanecendo por muitos anos após termos escutado pela última vez.
Mas por que isso acontece? E por que até mesmo pessoas com demência conseguem se lembrar tão bem da música?
Ao escutar música, diversas áreas do cérebro são ativadas simultaneamente. Isso cria uma rede de memórias que se fortalecem com o tempo. Vamos explorar os fatores que tornam a música tão memorável e por que ela é uma ferramenta poderosa para pessoas com demência.
Segundo Kelly Jakubowski, professora associada do departamento de música da Universidade de Durham, um dos motivos pelos quais as músicas são tão memoráveis é a familiaridade pura. “Ouvimos as mesmas músicas repetidamente, muito mais vezes do que lemos o mesmo livro ou assistimos ao mesmo filme. Essa superexposição a uma canção fortalece a memória.” Mesmo que tenhamos ouvido uma música pela última vez há 20 anos, é provável que a tenhamos escutado repetidamente naquela época. Isso explica por que conseguimos lembrar as letras, mesmo que não tenhamos ouvido a música recentemente.
A música está intrinsicamente ligada às emoções, e isso facilita a criação de memórias duradouras. Jakubowski explica que coisas emocionais são lembradas melhor do que coisas não emocionais. As emoções expressas pela música e as emoções que sentimos em resposta a ela – seja em um funeral ou em uma festa – criam memórias profundas. Quanto mais memorável a situação, mais provável é que lembremos da música que estava tocando.
Quando ouvimos música, não é apenas o córtex auditivo que é ativado. Áreas relacionadas à emoção, movimento e recompensa também são estimuladas. “As pessoas lembram dos movimentos e da vontade de dançar,” diz Jakubowski. “A música ativa uma ampla gama de regiões do cérebro, implicadas na memória, emoção, movimento e sensibilidade à recompensa.” Isso ajuda a explicar por que a música é tão eficaz em desencadear memórias, mesmo em pessoas com demência.
Pessoas com demência muitas vezes conseguem lembrar de músicas mesmo quando outras memórias se foram. Um vídeo viral de 2020 mostra uma ex-bailarina reagindo a uma melodia de “Lago dos Cisnes” de Tchaikovsky, movendo seus braços de maneira graciosa. Isso demonstra como a música pode despertar memórias e habilidades que parecem perdidas.
Sarah Metcalfe, da campanha Music for Dementia, testemunhou muitos momentos como esse. Ela conta que pessoas que não falavam há muito tempo começaram a cantar ao ouvir uma música familiar. Para as famílias, isso pode ser extremamente poderoso, trazendo de volta a voz de seus entes queridos.
A música também pode afetar o movimento. Metcalfe lembra de um homem que normalmente tinha dificuldade para caminhar, mas que dançava alegremente ao ouvir música em sua sala de estar. “Foi cativante ver a liberdade e a alegria no rosto dele naquele momento,” ela diz.
As memórias mais fortes de música geralmente vêm de um período específico de nossas vidas, conhecido como “bump de reminiscência”. Esse período vai dos 10 aos 30 anos, quando nosso cérebro está no auge do funcionamento e estamos formando nossa identidade. Além disso, há uma “bump de reminiscência intergeracional”, onde lembramos da música dos anos de adolescência de nossos pais, sugerindo que eles nos imprimiram a importância de certos tipos de música.
Desde crianças, usamos a música como dispositivo mnemônico para aprender o alfabeto, listar os estados dos EUA ou lembrar quantos dias há em cada mês. No final de nossas vidas, se perdermos a memória, podemos voltar a essas técnicas. Pessoas com demência às vezes são tocadas com músicas familiares, mas com letras adaptadas para ajudá-las a lembrar de suas rotinas diárias.